O Dilema do Especialista

sábado, setembro 18, 2010

Nunca a expressão "mercado de trabalho" fez tanto sentido quanto na época em que vivemos. Qual o seu comportamento quando vai ao mercado? Você tem uma gama de opções mas não conhece todas. Você verifica marcas, embalagens, o que você conhece, o que já comprou e, se você for de classe média ou menor, você escolhe o que atende custo, beneficio e sua atribuição de valor inconsciente. Parece que o mercado de trabalho se transformou na mesma coisa, principalmente para profissões criativas.

Você faz doutorados, mestrados, MBAs, pós-graduação, cursos de idiomas, cursos de especialização, e para onde vai a sua especialização? Claro, ela será usada, mas ela será valorizada? Não com elogios, mas você terá retorno financeiro deste custo físico, de dinheiro e mental ao longo dos anos? Provavelmente não. Na verdade você é escolhido pelo custo-benefício e valor incosciente atribuído à sua profissão no mercado (por mais que seu trabalho seja primordial, o inconsciente coletivo sempre deixa seu retorno lá embaixo).

Isso vale para todas as profissiões. Tenho amigos engenheiros e arquitetos que ganhavam somente a base do CREA. Nas áreas de TI e design/artes nem se fala, além de não valorizar o especialista, ainda há a exigência de saber tudo o que existe (o famoso "vou contratar um só, mas tem que saber 1,2,3,4..."). Quando me formei, e até hoje, vejo alguns amigos desistirem da profissão por uma opção mais lucrativa. A frustração os levou a concursos públicos, polícia federal, redes de computadores, sair do país, trabalhar como freelance ou consultor, e uma até se tornou médica, mas é coerente esta decisão, não do profissional, mas do mercado?

Quando os melhores profissionais ficarem descontentes e procurarem outros caminhos, o que será das empresas daqui a 10 anos? Dá pra acreditar numa empresa que diz que falta profissional especializado no mercado quando tenho à minha volta dezenas de amigos bons que não conseguem trabalho por que pedem um salário mais alto ou por que são overqualified (qualificados demais para a vaga)?

Será que vamos ter uma máquina do governo inflada de profissionais fantásticos que desistiram da iniciativa privada? Teremos o Brasil como exportador de excelência por que os especialistas não conseguem emprego aqui? Empresas nacionais indo à falência pela falta de qualidade? Falência não. As empresas vão se encher de profissionais baratinhos, "quebra-galho" e reduzir a qualidade. Será que vão exigir do "baratinho" um nível alto de qualidade até fazê-lo chorar? Ou vão pagar um consultor caríssimo (tudo está caminhando pra isso)? Vão se manter em mercados pequenos e deixar as grandes corporações trabalhar grandes mercados (Google, Yahoo, Apple, Viacom, Itau, Totvs, etc.)? E não me venha com essa história de Long Tail, se seus profissionais não são pensadores e sim produtores, você sempre vai ter o mesmo do mesmo e com mesmo nível.

Meus pais não têm curso superior, entretanto, ambos se saíram bem na vida, trabalharam em grandes empresas, tivemos sítios, apartamentos grandes, carros, conforto, etc. Mas será que você consegue esta mesma "construção de vida" nos dias de hoje? Com a sua formação, você consegue alcançar aquilo que seus pais conseguiram, ou melhor, mais ainda, afinal você é "especializado". O que aconteceu? As coisas estão mais caras ou você tem menos dinheiro? Você sente motivação para estudar mais quando você vê as perspectivas do seu mercado de trabalho, ou você já está ponderando entre as alternativas dos amigos citados? Quanto você acha justo ganhar? O quanto você acha que vale o seu nível de especialização e experiência?

Pior é que nas profissões criativas as pessoas já não exigem mais um especialista em uma coisa. Na época do meu pai um profissional entrava como OfficeBoy, estudava, aprendia na empresa, era promovido diversas vezes e podia terminar como diretor. Hoje as empresas querem que você entre já sabendo todos os detalhes de tudo, não querem ensinar nada, pagar curso nenhum. Não importa se você é muito inteligente, tem notas ótimas na faculdade, tem pós graduação, se você não souber um dos softwares ou um dos métodos, você está fora. Claro que a empresa não vai esperar anos para você aprender, mas dói esperar dois meses, três?

A preferência é pelo funcionário-máquina, aquele que produz rápido, de qualquer jeito, mas se ele conhece o software, o método, então tá bom. Ele não tem excelência, mas resolve o problema. Você já pensou se um filme da Pixar fosse feito assim? Que desastre. O filme saiu, o cliente tá feliz, mas poxa... o produto/serviço não fez tanto sucesso e só durou 02 anos... que pena. Vamos fazer outro? Deve ser por isso, vamos fazer outro então. Grito. Por que não chamar especialistas, demorar mais um pouco e fazer certo só uma vez? E não me venha com história de Agile, esse é o método mais mal-interpretado pelas empresas brasileiras.

O pior é que design, arquitetura de informação, design thinking, experiência do usuário e marketing digital têm virado termos hype no mercado de TI. Então por que internamente as empresas não valorizam esses profissionais já que fazem tanta questão de usar termos do mercado criativo como frente, o "slogan" para a venda de seus produtos e serviços?

Eu vejo uma crise em 10 anos, principalmente na área de TI e de ensino. As classes E, D e C estão mudando muito pouco (apesar de seu consumo de eletro-eletrônicos ter subido, seu crescimento está parado). Já as classes B e A estão se transformando em classe C. O que isso diz do futuro da nossa economia? E quando a maioria das pessoas não puder ou não quiser pagar pelas coisas que a gente produz por que não possuem condições? E quando aumentar a inadimplência nas parcelas e financiamentos por que os salários são baixos e por isso são voltados à necessidades básicas?

Pergunto ainda, e quando estas pessoas estiverem estressadas, com problemas de saúde, os hospitais públicos não funcionarem e você tiver diversos funcionários faltando (eu já vi isso acontecer em uma empresa que eu trabalhava com uma moça da faxina)? A solução é pagar plano de saúde pra todo mundo? E para onde vai a criatividade e a capacidade de raciocínio de um profissional frustrado, doente e cansado? Pelo salário que ele ganha, será obrigado a se mudar para longe, imagina a disposição desta pessoa durante o dia após ter passado 04 horas por dia em uma condução.

Hoje a geração Y é empreendedora e alguns acertam em cheio, mas e os que não acertam? E os que precisam trabalhar para as nossas empresas? Eles continuarão se tornando especialistas ou só estudarão o que você quer e pronto? Eles vão se esforçar sem o "chicote" para oferecer bons resultados? Você quer na sua empresa um profissional que tem faculdade, sabe o trabalho, mas não sabe pensar? Ah! A sua solução é colocar apenas uma pessoa que pensa e um monte de operários e estagiários na esteira? Ou melhor, vai pedir a opinião do sobrinho e mandar outros executarem? No final das contas ainda tem os pequenos serviços que você pode contratar para sua empresa em 02 horas e por R$ 100,00.

Não sei de onde veio esta mentalidade do mercado (a prostituição do profissional que aceita qualquer coisa), principalmente a idéia de que algumas profissões devem ganhar menos do que outras (se há risco de vida tudo bem - médico, engenheiro civil - do contrário, por quê?). Mas alguma coisa vai mudar, por que a geração Y que tem boa formação não vai se conformar. Se gasta-se tempo com estudos, aprendizado e experiências, a geração Y vai querer o retorno que merece.

Tenho medo do futuro das empresas brasileiras e da qualidade de seus produtos e serviços. Você pode fazer um concurso, mudar de estado ou sair do país, mas quem ficar vai ver mudanças grandes e inesperadas. Colapso? Crise? Não precisa ir muito longe, veja como era o subúrbio do Rio a 20 anos atrás e veja agora. Ser feliz e ter qualidade de vida é muito bom, mas não se constrói isso sem uma recompensa monetária.

Acho que é o adeus à classe B. A redução das diferenças não é por que o pobre está mais rico, é por que a classe média está mais pobre... Agora responda, você podia ser o "faz-tudo", o handyman do mercado de trabalho. Por que você virou especialista? Sério, faça as contas, parcela do carro, parcela de apartamento em local razoável, montar apartamento, alimentação, saúde, diversão, manutenção do carro, você acha que o mercado te ajuda a bancar essa qualidade de vida que você espera?

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Poesia: Se Ela Soubesse

terça-feira, setembro 07, 2010

Meu amigo, como posso contar o horror que vivo. Não sei como começar a falar sobre estas velas que iluminaram minha mente e que se apagaram enquanto a trupe celeste terminava sua obra cômica. Pois sim, não a vi mais. Nas mudanças que ocorreram, de tudo o que deixou saudade, creio que na felicidade, ao final caro amigo, ela só deixou poesia. Não esperava promessas, pois ela não sabia, mas este foi um engodo que eu próprio infligi ao meu ego, ao meu orgulho, ao meu desejo, ao meu futuro. Não quero que ela seja mais uma...

Mais uma nos meus arrependimentos, mais uma na linha do “se”... se eu pudesse, se ela quisesse, se eu tivesse, se ela soubesse... Ah se ela soubesse. Agora é tarde, pois ao receberes esta carta estarei longe. Não longe de ti meu amigo, mas longe do rosto pálido, do sorriso largo e dos fios rubros daquela que deixei para trás. Se da infelicidade não me faço rir, é por que a alma pesada e os pés inquietos ainda querem que ela saiba. Ah se ela soubesse...

Estou farto de poesia meu amigo, cansado das noites com a mão na pena. Agora quero o diálogo do marquês, o sussurar do amante, a valsa do libertino... a poesia não funciona meu amigo, é a bebida que entorpece o bufão e que oferece os fios rubros àqueles que cortejam sem amor. Que bonitas palavras, ela diz... mas não me acompanha...

Certo é o homem que da tribulação constrói a farsa e da farsa ergue seu império. Da farsa tira o sangue, beija-lhe os lábios, entrelaça os dedos nas madeixas alaranjadas. Respiro. Caio de novo. Desculpe-me meu amigo. Quem pode dizer o que ela faria? Ah se ela soubesse... Ela nunca soube.

Não misturo mais, não vou jogá-la aos leões da minha imaginação e impaciência, ou ao declínio de meus devaneios. Se nunca me expressei, se nunca ergui meus braços, não há o que reclamar de minha pantomima... reclamo é da arte e dos vicínus que roubaram meu espírito para entregar luxúria no lugar de paixão. Por que ela aceita? Meu coração dói... Por que ela compactua com as forças da libido e renega que a combinação de desejo, amizade e gratidão está sob seus olhos? Ah se ela soubesse.

Vida é para ser vivida meu amigo, e talvez, talvez ela será reimaginada, repaginada, esquecida, substituída. Só queria que ela soubesse...

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