Crítica: Benjamim Button

sábado, janeiro 17, 2009

Apesar de encarar mais uma vez o péssimo atendimento do Cinemark Botafogo (uma só pessoa para atender uma fila imensa em um guichê de 07 baias), os assentos desconfortáveis, anti-ergonômicos e sem apoio de cabeça, e os pequenos espaços de circulação (típico de um complexo comercial de cinemas sem amor à 7ª arte), vi um filme muito bom hoje que recomendo.

No final de minha infância e inicio da minha adolescência, eu costumava dizer para minha mãe que eu havia nascido na época errada e no lugar errado. Eu queria dançar o dixieland jazz nos clubes nova iorquinhos dos anos 30, ver Jerry Lee Lewis no palco, ver o show dos Beatles no Ed Sullivan Show, participar de uma grande guerra e voltar pra casa para a garota dos meus sonhos, voar com a Esquadrilha Lafayete, descobrir segredos de milhares de anos como um arqueólogo vitoriano, colecionar fotos de Bettie Page, me impressionar com os primeiros quadrinhos do super-homem e ficar encantado com as matinês dos pequenos cinemas americanos.

Mas a vida nos dá nossa própria época e memórias, e muitas vezes não sabemos como aproveitá-las ou até mesmo garantir que nossos sobrinhos, filhos e netos poderão um dia ver filmes sobre o fascínio que tinhamos sobre nossa cultura pop. Benjamim trás um pouco desta volta ao passado, em diversas épocas, mostrando que no fundo somos todos iguais. Nossos medos, aspirações, preconceitos, e que o mais dificil é largar a falta de esperança e o "tecnocracismo" para se entregar-se a uma vida cheia de surpresas espontâneas e incríveis.

Benjamim Button é um menino que nasce velho, enrugado e feioso, e por isso é abandonado pelo pai na porta de um asilo (referência a uma família ficticia, os Button, que inventaram os botões e têm como concorrente o inventor do zíper). A zeladora do asilo adota a criança que incrivelmente fica mais nova a cada ano. Durante esse rejuvenescimento Benjamim descobre as amizades, o amor, o sexo, o álcool, tudo com o olhar de uma criança que acabou de descobrir que uma formiga queima à luz da lupa, que as dormideiras fecham com o toque, que não existem monstros no escuro, a vida de Benjamim é pura descoberta no sentido inverso de tudo o que nós já vivemos. Imagine só descobrir o sexo com 13 anos quando todos acham que você tem 80...

O filme já começa com uma cena bem emocional. Um grande inventor faz um relógio para uma estação de trem, mas o relógio roda ao contrário... Emocionado o inventor diz que o relógio roda ao contrário para que seu filho volte vivo da 1ª guerra, algo que nunca deveria ter acontecido. Junto ao seu discurso aparecem cenas da 1ª guerra como que "rebobinadas", e as pessoas da estação entendem e se identificam com a mágoa do homem que só espera que a humanidade um dia acorde e resolva fazer a coisa certa.

A mensagem do filme cresce ao longo da projeção e vai ficando mais forte fazendo até as mentes menos acadêmicas refletirem sobre sua própria condição no mundo, idade e identidade, as coisas que deixamos de fazer depois de velhos por que queremos ser "adultos responsáveis", e tantas outras coisas que deixamos entrar na nossa cabeça por uma falta de um "pensar próprio" que nos faça ponderar antes de abraçar o legado cultural retrógrado de uma sociedade parada no tempo com seus preconceitos, modismos, tradições sem sentido e que tende a julgar todos que são diferentes. Para Benjamim o que importa é ser feliz, viver como uma criança mesmo que esta criança tenha responsabilidades. Para Button a vida e as pessoas são a maior dádiva que alguém pode ter.

O roteiro do filme é de Eric Roth, por isso se você é um viciado em cinema, como eu, vai logo perceber o estilo de narrativa e diversas cenas e dramas idênticos ao de Forrest Gump, outro filme escrito por Roth. A mãe sábia sem instrução que faz tudo para a felicidade do filho, o louco marinheiro beberrão que tem um bom coração, a paixão de infância que cresce e faz besteiras até descobrir que realmente ama o protagonista (lembra de Robin Wright, a "Jenny" em Gump?), as cenas mescladas com fatos históricos, o encontro com celebridades e as piadas engraçadinhas como o cara dos raios (as cenas do vovô são hilárias, mas os videos em preto-e-branco foram desnecessários e apelativos demais... bem "povão").

Uma das coisas bonitas que Roth traz desde Forrest Gump é que quando você ama alguém de verdade, a presença dela, sua companhia, é mais importante do que sexo, beijos ou carícias. Era isso que Button busca no inicio em Daisy e ela não entende. Mas no mundo do cinema nada se cria, tudo se copia (até de si mesmo como Roth). Até mesmo o grandioso Batman Dark Knight de Christopher Nolan usou passagens do conto "Os Destruidores" de Graham Greene - também citado em Donnie Darko - copiando a índole do Coringa com base nos adolescentes que queimam pilhas de dinheiro só para ver o caos.

Quanto aos efeitos especiais. Eu trabalho com computação gráfica, então dificilmente algo CGI me parece real, principalmente quando tenta replicar pessoas (pois estamos muito acostumados com o rosto humano para sermos enganados pelo brilho falso dos modelos 3D). Entretanto admiro a tentativa de utilizar o rosto de Brad Pitt substituindo o rosto dos atores que interpretaram Benjamim velhinho, inclusive o bebê enrugado. Esta técnica tem sido utilizada amplamente, desde o filme X-Men para mostrar Magneto e Xavier mais novos até nos novos Guerra nas Estrelas para mudar falas (sim! Eles mudavam lábios e expressões para mudar diálogos). A mais conhecida técnica foi usada pela Eyetronics no documentário dos últimos dias de Hitler que recriava cenas da 2ª Guerra fazendo rostos perfeitos de Hitler, Roosevelt e Churchill em 3D, que eram sobrepostos aos rostos dos atores reais. Pelo menos no documentário ficou perfeito, mas Button não engana...

Vale ressaltar que os produtores deste filme são Kathleen Kennedy e Frank Marshall, "figurinhas carimbadas" do cinema desde os filmes de Indiana Jones, E.T. Poltergeist, Goonies, De Volta para o Futuro, Viagem Insólita, Império do Sol, Persepolis, Munique, Parque dos Dinossauros e tantos outros sucessos. Cate Blanchet também está linda neste filme (como sempre), e é mais surpreendente ainda e apaixonante ver sua cara rejuvenescida nas cenas que mostram Daisy adolescente. O elenco inteiro é fanstástico, um trabalho quase de teatro (fazer teatro é o sonho de 99% dos atores americanos). O filme foi feito em Nova Orleans, a cidade que ficou conhecida pela devastação feita pelo furacão Katrina.

Com excessão dos efeitos faciais e as cópias descaradas de cenas e dramas de Forrest Gump, vale a pena ver Benjamim Button com o coração aberto, a mente livre e um pouco de reflexão. Não deixe que os filmes acabem quando você sai do cinema. Se você não trás sua diversão, seu aprendizado e suas amizades para o crescimento de sua vida, como individuo, como "ser social", como trabalhador e como solucionador de problemas, é por que aquele tempo gasto não lhe serviu de nada.

Um dia você vai acordar e perceber que trabalhou, se divertiu, teve filhos, casou, viajou, mas nunca fez nada realmente grandioso com a sua vida, nunca seguiu seus sonhos, trabalhou e seguiu a rotina que os preceitos da sociedade esperavam de você. Tentou agradar a todos e nunca fez o que realmente lhe era importante. Os filmes são mais do que 2 horas de diversão, são portas para algo maior que pode ser aplicado no trabalho, na escola, na faculdade, na familia, nas amizades, no amor, na sua forma de ver o mundo. Deixe Benjamim lhe ensinar um pouco das coisas que realmente valem a pena na vida. Quem sabe você não larga tudo e se junta a um barco pesqueiro como Gump e Button?

5 comentários:

Anônimo disse...

Conheço a história porém nunca li o livro.
Mas quero muito assistir esse filme.
Creio que será muito bom,pois esses assuntos "utópicos" me chamam muito a atenção!
Gostei do seu post!
Abraço!
Quando puder me visite:
http://oitentando.blogspot.com/

Anônimo disse...

Olá.
Gostei do teu texto, estava justamente procurando alguém que tenha achado o filme parecido com Forrest Gump, como eu também achei.
Só não consigo ser tão benevolente com a "mensagem" do filme, ou com essa tentativa de cria metáforas a partir de situações absurdas - que em outros filmes como "O Perfume" funcionam bem melhor, creio.
Tenho percebido a repetição de uma espécie de "estética para fazer chorar" em alguns filmes hollywoodianos supostamente sensíveis ou diferentes: muito diálogo forçado, muita música triste, fotografias apoteóticas. E no meio disso tudo, o ator desaparece e fica a ilusão de que tudo vai bem. Não creio que há nada de relevante no trabalho do elenco. E nem poderia haver, já que o roteiro prioriza uma enorme quantidade de cenas e locações irrelevantes à temática. A cena da guerra é um buraco no meio do filme. Pra quê citar Peral Harbor? Só serviu pra me lembrar de outro filme, bem ruim...
Enfim, esse filme não é ruim, é até muito bem feito, um virtuosismo técnico, mas não teria perdido nada deixando pra ver em casa daqui um tempo. Enquanto via o filme, pensava: por quê gastar tanto dinheiro numa cena de 5 segundos?? E as cenas dos relâmpagos, concordo, desnecessárias, e no caso de um cinema lotado, causou o rompante desproporcional de risadas do "povão" que precisava respirar, irritando tanto quanto o barulho da pipoca.

Anônimo disse...

Exelente POST! Parabéns!

Anônimo disse...

Cara, exxxcelente resenha!!!! Acabei de chegar em casa, depois de assistir ao filme, e fui logo pesquisar a crítica das pessoas pela internet afora... É fato que associei-o logo ao estilo de "Forrest Gump", mas, logo de cara, a saída de roteiro me fez lembrar muito também de "Titanic": a atriz velhinha que narra sua maior história de amor... Gostei muito! Chorei um pouco em algumas partes! Mas achei realmente que poderia ter sido mais enxuto em alguns trechos, como, por exemplo, naquele affair que Benjamin teve com a nadadora... Ah, também achei que aquele beija-flor forçou uma barra; meio desnecessário nas duas ou três vezes em que bateu as asas!... rs Parabéns pelo texto! Abraço

Lara disse...

Olá Xande!
Você escreveu muito bem sobre esse filme, eu só agora assisti e simplesmente ele ainda não saiu da minha cabeça.
Minha vontade é viajar, conhecer outros pontos de vista, sentir o coração batendo e o vento no rosto. Não sei quando ainda, mas um dia farei isso.
Parabéns pelo post, um abraço!

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